O bebê

Na volta de uma viagem tinha um bebê ao nosso lado, no avião. Daqueles bem simpáticos, distribuindo sorrisos banguelinhas para todo mundo, balbuciando para chamar a atenção.

Seu desenvolvimento, ao que parecia numa observação superficial, estava ótimo aos 6 meses. Tudo indo bem!

Pensei nos tantos casos assim que conheço. Nas muitas histórias com o mesmo começo, porém com evolução diferente. “Ah doutora, ele era muito carismático, olhava bastante no olho, conversava, brincava. Mas um dia acordou diferente.”. De repente, o bebê que fazia tudo passa a ficar mais quieto, menos comunicativo, já não olha tanto e nem responde pelo próprio nome, não faz mais o jogo social para chamar a atenção, não se interessa pelo nosso rosto, não nos busca como referência social. As palavrinhas que antes existiam já não aparecem mais.

Entre tantas perdas de habilidades, alguns incômodos sinais: ele fica mais irritadiço, gosta de brincar com objetos de forma diferente, girando rodinhas, enfileirando tampinhas e colocando tudo na boca; surgem então alguns movimentos diferentes, nunca vistos antes, mas que chamam a atenção pela frequência e forma que ocorrem. Situações cotidianas, como cortar o cabelo ou as unhas, passam a ser um martírio. Para a criança e para a família.

“Ele está diferente”, dizem os pais. “Antes fazia várias coisas que não faz mais”. Esse relato é muito recorrente no meu dia a dia. E por isso fiquei pensando se essa seria a história dessa criança do vôo. Hoje, sorridente e típica. Em alguns meses, neuroatípica. Não estou dizendo que desejo que isso aconteça, obviamente. Mas sei que há probabilidade.

O caminho? Orientar a família sobre sinais precoces de atraso do desenvolvimento, sinais precoces de autismo, e a necessidade de intervir sempre, estimular em todas as oportunidades e ensinar a brincar.

Se todas as famílias soubessem da importância desses primeiros meses de vida para o desenvolvimento de suas crianças, daríamos a esses pequenos oportunidades únicas de um futuro com dignidade, autonomia e independência.