Enzo Pellegrino

Café com leite

Coluna de Enzo Pellegrino Pedro

Café com leite

Publicado em: 30 de setembro de 2023 às 01:46

Todo mundo, quando era criança, já foi considerado o “café com leite” em alguma brincadeira. Era assim que chamávamos (não sei se chamam até hoje, seria necessário consultar a criançada para ter certeza) a criança sem condições de participar normalmente das competições, talvez por ser mais nova ou então por não poder correr ou se esconder como as demais.

Mas o tempo vai passando e chega o momento de ser tratado como um igual, sem facilitarem nossa vida ou sentirem pena por perdermos. Chega ou pelo menos deveria chegar.

Enquanto a maioria de nós cresce e é obrigada a amadurecer com as pancadas da vida, sejam elas realmente graves ou difíceis apenas para aquela fase de imaturidade, alguns insistem em viver como se fossem pobres coitados. Perdem e se frustram como todos os mortais, mas agem como se fossem ainda intocáveis, merecedores de toda a ternura e comiseração das demais pessoas ao redor… Como se para sempre fossem os “cafés com leite”.

Não sei você, leitor, mas eu, particularmente, sinto um pouco de vergonha alheia quando vejo um marmanjo de 20, 30, 40 anos de idade se comportando como se a bola fosse sua e pudesse simplesmente levá-la embora se o jogo ficar desagradável. Levam a vida como o “Menino Ney”, que pode fazer a maior cagada do mundo, ciente de que seu pai virá a público para transformá-lo em vítima.

O questionamento que fiz a mim mesmo durante essa semana foi o seguinte: até quando podemos considerar alguém imaturo devido à idade ou à fase da vida? Quando acaba o passe livre para atribuir as besteiras de alguém à juventude? Seria quando acaba a escola? Quando termina a faculdade? Ou então quando casa ou tem filhos?

Estou lendo um livro sobre a dopamina, substância química que impulsiona em nosso cérebro o amor, o sexo e a criatividade, controlando quem somos, o que sentimos e o que fazemos (citei o que está na capa porque spoiler é coisa de moleque). Na obra de Daniel Z. Lieberman e Michael E. Long, aprendi que o córtex pré-frontal, uma importante área do cérebro que nos ajuda a conter nossos impulsos, a fazer planejamentos e a tomar decisões, só termina de se desenvolver na fase adulta, o que explica a maior facilidade que temos para não tomar decisões erradas ou precipitadas conforme envelhecemos.

Dito isso e ciente de que não há respostas exatas para as perguntas feitas acima, acho correto considerar que cada idade tem seus erros específicos e, obviamente, uns são mais responsáveis que outros por natureza, educação ou discernimento sobre o mundo e as regras em geral. Por exemplo: é compreensível crianças brigarem por querer um brinquedo, porém inaceitável agir da mesma forma na adolescência.

Os mimados podem ter qualquer gênero, orientação sexual, cor da pele ou classe social, só que um grupo, por motivos óbvios, sempre consegue sobressair nas bizarrices  praticadas sem mamadeira, chupeta ou fralda (deviam usar para sempre, aliás): os homens de boa condição financeira, acostumados desde cedo a culpabilizar terceiros e a não assumir as pequenas derrotas da vida, representados em diversas obras literárias como aquele primo chato e mesquinho cujos pais protegem como se de porcelana fossem, como é o caso de Duda Dursley, o intragável primo de Harry Potter.

Vi vários deles passarem dos 20 anos de idade falando o que bem entendiam e em momentos inoportunos, sem qualquer repreensão de terceiros porque tratavam como uma fase em que falar (ou fazer) besteira era normal; ultrapassaram a casa dos 30, continuam a mesma coisa e recebem o mesmo julgamento de normalidade, ainda que todos os demais tenham melhorado seu comportamento há mais de uma década. Quer saber quem são os protegidos da sua turma? É muito simples, basta prestar atenção e perceberá que o caos pode reinar em todo tipo de discussão, mas quando a coisa fica feia para o imaturo, surgem 2 ou 3 para botar panos quentes.

Enquanto os sãos lutam para ganhar discernimento e conhecimento, os bobos já envelhecidos fazem plateia para si mesmos e criam intrigas e discussões como se tivessem 5 anos de idade. Viram pessoas umas contra as outras, param de falar com amigos por ciúmes, insistem em ser o centro das atenções. São eternamente os “cafés com leite” e lutam bravamente para não sair dessa posição — só não podemos falar em voz alta, porque seria terrível se ouvissem e se chateassem.

Depois que você entendeu que determinada conduta é errada, a idade, seja qual for, não pode ser uma desculpa fácil. É como se não existisse falha de caráter, maldade e inveja no mundo. Como se o “café com leite” tivesse um direito adquirido ao tratamento diferenciado de sua posição.

Pode ser isso mesmo… Talvez não seja falha dele, ainda que com mais de 30 anos nas costas. Deve ser culpa do córtex pré-frontal.


Enzo Pellegrino

Enzo Pellegrino

Enzo é advogado em Santa Cruz do Rio Pardo


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