Franco Catalano

As mais belas casas de Santa Cruz do Rio Pardo - 2

Coluna de Franco Catalano

As mais belas casas de Santa Cruz do Rio Pardo - 2

Publicado em: 14 de setembro de 2023 às 23:15

Residência de Maria
Helena e Pedro Renófio

 

Dando sequência à série de artigos acerca das mais belas casas de Santa Cruz do Rio Pardo, a casa de número dois, número este apenas cronológico no que diz respeito à confecção desta coluna, não cronologicamente posicionada e nem ranqueada em relação à anterior, é também pertencente a uma de minhas tias-avós. Não me acusem de nepotismo, bairrismo ou favoritismo. Em comum, Maria Helena Renófio e o casal Enid e José Eduardo Catalano têm não apenas o sobrinho-neto e o fato de ocuparem esquinas nobres na cidade, mas ambos são, na minha não muito humilde opinião, proprietários de dois dos mais belos exemplares arquitetônicos da “Joia da Sorocabana”.

Diferentemente da casa do Tio Zé e da Tia Enid, cujas dependências frequentei em poucas e memoráveis ocasiões, a casa da Tia Maria Helena frequentei intensamente na juventude e frequento até hoje, tornando este artigo possivelmente o mais fácil e familiar de se escrever de toda a série que estou planejando.

Como já elucidei na edição anterior, estes textos são produzidos através de minhas memórias, de meus conhecimentos da área e, principalmente, de entrevistas realizadas com os sortudos moradores destas casas escolhidas a dedo. Um roteiro padrão, com 15 perguntas objetivas e abstratas guia o tom e o conteúdo que se seguem.

A conversa com minha tia reforçou minhas impressões juvenis e minha análise adulta, me fazendo imaginar que a residência do casal Pedro (in memoriam) e Maria Helena Renófio poderia ser resumida em uma frase: uma casa com vocação para festejar.

Inaugurada em 1982, a tempo da celebração do aniversário de 18 anos da caçula Patrícia, que divide o aniversário com a véspera de ano novo, a casa permitiu que fosse criada uma tradição de festas de réveillon inesquecíveis que se repetiram todos os anos até o falecimento do patriarca em 2004.

 

 

Da concepção à concretização, o projeto da casa passou por várias mãos de bom gosto: a inspiração saiu das páginas da Revista Casa e Jardim, os croquis iniciais foram levados a um arquiteto paulistano de nome Hernani, amigo do irmão de Maria Helena, João Castanho Dias, que fez algumas alterações e encaminhou os proprietários para um escritório técnico nos Jardins, que desenvolveu as plantas complementares de elétrica e hidráulica. O projeto de interiores, contratado ainda durante as construções, leva a assinatura da atuante e celebrada Ana Maria Viera Santos.

A casa de inspirações coloniais, com largos beirais de telhas de barro e madeiramento aparente, portas, janelas e pórticos em arco achatado e uma geometria simples, mesclou bem o estilo revivalista com as tendências herdadas do modernismo. A planta, extremamente bem resolvida, tem salas íntimas e sociais interconectadas em diversos níveis, sempre com duas ou mais vias de acesso a elas. Desníveis internos ajudam também a delimitar os espaços, que receberam piso de tábua corrida de ipê que resiste até hoje sob os cuidados da viúva e do filho Júnior, que herdou da mãe a paixão por arquitetura e decoração.

Pedro e Maria Helena eram amigos próximos do irmãos Quagliato. E por essa razão frequentavam a bela e histórica Fazenda Jamaica. De lá, Pedro tirou inspiração para um dos mais marcantes elementos da decoração interna da casa que viria a construir: as vigotas em madeira maciça que sustentam o forro da generosa sala de estar da família.

Embora muito do que se pode observar seja preservado da época da construção, algumas alterações foram feitas: após o falecimento do marido, Maria Helena adquiriu e integrou a seu jardim o terreno vizinho, dando ainda mais respiro e charme ao já bonito jardim com piscina. A cor da fachada, hoje em tons terrosos, era branca, e a porta de entrada, antes arqueada e com vidros no contorno, deu lugar a uma porta preta retangular. A decoração ganhou ares mais atuais com os conselhos do filho, que adicionou tons de azul com lindos ladrilhos hidráulicos na varanda e paredes num verde intenso no hall e na sala de jantar, além de ótima curadoria de obras de arte penduradas nas paredes ou sobre pedestais. Muitos dos móveis, como os sofás profundos e as cadeiras de jantar são os mesmos desde a inauguração, recebendo apenas novos revestimentos.

Passados mais de quarenta anos, a casa de Maria Helena e Pedro Renófio segue atualíssima, em parte graças à inteligência do projeto original e também graças aos esforços dos moradores em mantê-la bela e interessante. Essa joia da “Joia da Sorocabana” testemunhou mudanças na cidade, na política e no país, além de inesquecíveis festas de aniversário, réveillon, noivados e batizados, mostrando que a arquitetura bem pensada e a dedicação à preservação podem transcender o tempo e transformar-se em páginas da história da cidade.


Franco Catalano

Franco Catalano

Arquiteto, é santa-cruzense e estudou História da Arte em Madrid


SANTA CRUZ DO RIO PARDO

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