Fôlego

Após um jejum forçado de dois anos, Londrina voltou a sediar seu tradicional Festival de Dança. Durante mais de uma semana, dezenas de companhias se apresentaram no palco do tradicional Teatro Ouro Verde, prédio modernista do aclamado arquiteto Vilanova Artigas.

Um dos espetáculos que tive a oportunidade de assistir, o de encerramento, chamado V.I.C.A. (da Companhia de Balé do Teatro Guaíra de Curitiba), foi resultado de reflexões acerca da vida no mundo pandêmico e pós-pandêmico. A montagem, pensada para tirar o espectador da zona de conforto, contava com uma mescla entre os mundos físico e digital, com inserções de projeções sobre o palco.

Durante toda a apresentação, no primeiro plano, uma película de tecido fino e semi-transparente separava os bailarinos da plateia. Com o tema da pandemia, interpretei essa simples, porém poderosa adição cenográfica, como uma tela sobre a qual se confundia o real (físico) com o imaginário (projeções), como fomos obrigados a fazer com o boom do trabalho remoto, reuniões online e a quase extinta interação humana nos primeiros meses do lockdown. Minha esposa teve uma interpretação diferente, porém também relacionada às dificuldades que todos vivenciamos neste episódio que marcou a história recente da humanidade: o tecido seria uma metáfora para as máscaras de proteção individual, que tornaram a comunicação e as interações muito mais distantes e frias, nos desumanizando socialmente.

De qualquer maneira, é muito bom saber que apesar das milhões de mortes e dos efeitos terríveis sobre a economia global, a cultura consegue enfim respirar novamente.