Publicado em: 22 de abril de 2022 às 21:51
“Eu sou descendente de portugueses e alemães por parte do meu pai. De italianos e índios por parte da minha mãe. Enfim, sou brasileiro, né”.
A gente já se viu em um diálogo como esse. Buscando nossa ascendência e dividindo-a com certo orgulho, como se houvesse uma herança cultural que chegaria a nós naturalmente e faria do povo brasileiro o mais rico em misturas — o mais miscigenado, como se costuma afirmar com ares de sabedoria.
Os mais endinheirados chegam a procurar fundamentação para sua ancestralidade, pagando pesquisas genealógicas e lutando por uma dupla cidadania. Este caso se aplica a quem tem ancestralidade europeia, geralmente. Pouco importa se, em casa, o idioma do país do qual descenderia não foi ensinado, ou se quase nada se sabe a respeito deste. Busca-se afirmar um vínculo que traria alguma superioridade, por estar enraizado na Civilização Europeia, tomada por nós como exemplo de desenvolvimento, de refino e urbanidade.
Nossas raízes indígenas e africanas são elementos a respeito dos quais enfatizamos a culinária, a música e os nomes de lugares. Não é usual buscar sua história. Sequer temos a marca dos sobrenomes desses ancestrais. O que encontraríamos se olhássemos para esse aspecto de nosso passado? Penso que a maioria de nós simplesmente prefere não fazer isso.
Refazemos o percurso da colonização portuguesa, impondo a cultura europeia e colocando-a em posição superior. Absorvemos elementos indígenas e africanos, mas sem nunca permitir que isso esteja em lugar central. Não temos sobrenomes desses povos; não há busca pelas famílias africanas trazidas à força para o Brasil. Os indícios estão apenas nos sobrenomes populares, que foram escolhidos para ocultar as origens não europeias.
Seus elementos estão presentes apenas como se fossem lembrancinhas, as quais consideramos simpáticas e gostamos de exibir em uma prateleira, ou festejar em alguma data. Festejo esse sempre marcado por ações toscas, meros arremedos da grandeza que esses povos tiveram antes do invasor europeu arrancá-los de suas vidas.
Gostamos de suas culturas apenas enquanto representações congeladas no tempo, inofensivas, sem questionar a legitimidade de nossas convicções. Sem sujar de sangue os nomes, datas e figuras que veneramos hoje. Quando nos deparamos com a cultura viva, apressamo-nos em menosprezá-la. O indígena hoje não seria “legítimo”, pois apresenta elementos da cultura “moderna”, como se tais elementos não tivessem sido impostos desde a chegada dos europeus.
Se os povos indígenas lutam por suas tradições, incluindo suas terras, são rapidamente taxados de incivilizados, vagabundos e oportunistas. Acabam sendo mortos por aqueles que têm interesse em tirá-los do caminho para explorar riquezas naturais ou simplesmente tomar suas terras.
As tradições de origem africana, incluindo as religiões como umbanda e candomblé, são perseguidas e estigmatizadas como diabólicas a todo momento. Toda a força de diversas culturas é esmagada e domesticada, ficando apenas o pitoresco, aquilo que é aceitável para padrões de branqueamento e de opressão.
A violência da colonização e da escravização continua presente em muitos elementos da cultura brasileira. Abordamos rapidamente aqui apenas alguns deles. A reflexão que propomos é a de que, se realmente valorizamos nossas raízes, precisamos nos desfazer da europeização, dando espaço legítimo às linguagens, culturas e tradições dos povos originários e dos povos que foram trazidos escravizados.
Psicólogo (CRP 06/96910), Doutor em Psicologia pela Unesp. Escreve quinzenalmente. Contato: (14) 99850-0915
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