Pascoalino S. Azords

Renato chegando

Coluna de Pascoalino S. Azords

Renato chegando

Publicado em: 15 de outubro de 2022 às 09:23

Eu tinha três anos de idade quando minha mãe trouxe o Renato pra casa. Eles vieram num carro de praça, que era como se chamava taxi antigamente. Minha mãe só andava de carro quando ganhava nenê – foram seis vezes, portanto. Naquele tempo, meu pai era viajante, que era como se chamava o representante comercial dos laboratórios farmacêuticos. Acharam mais seguro que minha mãe concluísse a gestação na casa de algum parente e não em São Paulo, com dois filhos ainda muito pequenos para piorar. Por isso, enquanto meu pai visitava drogarias no norte do Paraná, José Renato nasceu em Jales. Para economizar, meu pai se hospedava em hoteizinhos pra lá de modestos, todos feitos de tábua, com um único banheiro coletivo no final do corredor. Quando uma borboleta veio dividir com ele o pouco espaço do quarto, às 8 horas da noite, meu pai intuiu que o seu terceiro filho tinha nascido a 500 quilômetros dali — acertou!

Ainda menor de idade, Renato mudou-se para a América do Norte. Primeiro, ele tentou o Canadá, como bolsista do Rotary; depois, se fixou nos Estados Unidos. Casou-se com uma moça americana, teve três filhos americanos e três netos americanos. Para não assustar o pessoal de lá, meu irmão já fala e escreve em português com alguma dificuldade. Nas últimas quatro décadas, a gente pouco se viu. Meus pais os visitaram uma única vez — há 20 anos atrás.

Tamanha distância só reforçou em Renato a condição de filho preferido, coisa que a gente já suspeitava desde pequeno, mas que nunca deixou ninguém enciumado. Talvez essa deferência tenha nascido na noite em que escolhíamos feijão na mesa da cozinha, sob a luz de um lampião, e ele brincou de enfiar uns grãos no ouvido. Meu pai perdeu um dia de trabalho para leva-lo a um otorrino de Fernandópolis. O último grão foi resgatado em casa mesmo, dias depois, com uma agulha de crochê – já estava brotando! Pois nem comendo uma gilete inteira, uma de minhas irmãs conseguiu roubar de Renato o posto de queridinho da mamãe.

Ontem, dia 15, meu irmão voltou à casa de meus pais acompanhado da esposa e filhas. É a primeira vez que Renato não encontra minha mãe esperando por ele com o terço na mão, rezando no sofá, acompanhando missa na TV.

Disfarçado de santo de gesso ou de piano de armário eu queria estar lá para ver. Ver para me lembrar um dia, como lembro o dia em que o vi chegar da maternidade num carro de praça, no colo da minha mãe, há quase 60 anos.

 

* Publicada em 16/12/2018 e republicada em 16/10/2022


Pascoalino S. Azords

Pascoalino S. Azords

Cronista, mantém coluna no DEBATE desde 1977


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