CULTURA

As antigas escolas de datilografia

As antigas escolas de datilografia

Publicado em: 07 de junho de 2020 às 14:08
Atualizado em: 14 de novembro de 2022 às 17:01

Houve um tempo em que era preciso ser datilógrafo até para ser aprovado em concurso público

Sérgio Fleury Moraes

Da Reportagem Local

Pode parecer estranho, mas a máquina de escrever foi uma das invenções mais importantes da humanidade, revolucionando a sociedade e aprimorando a escrita, que até o século XVII era praticamente manual, à exceção da imprensa. Além de impulsionar a comunicação, a máquina foi decisiva para a entrada da mulher no mundo dos negócios, com o surgimento da profissão de secretária. Se a primeira engenhoca surgiu em 1714, na Inglaterra, foi no século XX que a ideia se aperfeiçoou, inclusive com o aparecimento de modelos elétricos.

Foi uma invenção tão duradoura que a última máquina de escrever saiu da linha de produção em 2011, devorada pela popularização do computador. Durante todo este tempo, especialmente no século XX, saber datilografar — o que hoje se conhece por “digitar” — era obrigatório em qualquer profissão. Não por acaso, havia escolas especializadas em formar datilógrafos. Em Santa Cruz do Rio Pardo, a pioneira foi instalada numa das salas da antiga “Escola de Comércio XX de Janeiro”.

 

 

ANOS 1950 — Prédio antigo da Santa Casa foi sede da primeira escola

 


Eduardo Pimentel, filho do patriarca José Cesário Pimentel, fundador da Oapec, ainda se lembra que a ala de datilografia não chegou a pertencer ao grupo por uma questão de amizade. Segundo ele, o curso técnico de contabilidade começou a funcionar na esquina da antiga Santa Casa de Misericórdia em 1957, no local onde hoje é o Pronto Socorro do hospital. Na época, a Santa Casa como a cidade conhece estava começando a ser construída. Além de Cesário, no início eram sócios o ex-prefeito Lúcio Casanova Neto e o reverendo José Coelho Ferraz, da Igreja Presbiteriana Independente.

Para o registro definitivo da “XX de Janeiro”, porém, o Ministério da Educação exigia que a escola tivesse uma sala de datilografia e seu instrutor, o curso de mecanografia no currículo. Cesário Pimentel, então, foi atrás de máquinas de escrever, pois o mínimo exigido eram dez. “Naquele tempo as Remington dominavam o mercado e o preço não era baixo”, conta Eduardo.

Quando foi negociar com um amigo de Avaré que vendia máquinas ao contador havia muitos anos, Cesário recebeu uma oferta inesperada. O vendedor propôs ceder todas as máquinas sem custo algum, caso Pimentel concordasse que um irmão dele fosse o responsável pela sala de datilografia. Como Cesário estava mais interessado no curso técnico de contabilidade, aceitou a proposta.

E Antonio Martins Fernandes veio para Santa Cruz do Rio Pardo, morando na antiga pensão conhecida por “Vila Zoé”, na rua Marechal Bitencourt, onde hoje é o edifício San Rafael. “Ele morou muito tempo lá, começou a namorar uma funcionária da Caixa Econômica, se casou e acabou ficando”, conta Pimentel.

A exemplo da “Escola Técnica de Comércio XX de Janeiro”, que deu origem ao grupo Oapec, a pequena escola de datilografia fez sucesso. Eduardo conta que havia turmas nos três períodos, sendo o noturno muito concorrido.

Cinco anos depois, Eduardo Pimentel foi procurado por um senhor de idade, pai de um jovem paraplégico. Queria abrir uma escola de datilografia para o filho, mas precisava legalizar a instituição e ter alguém com mecanografia para assinar os diplomas.

 

 

 

 

Eduardo Pimentel participou da criação de duas de datilografia Santa Cruz

 


Pimentel foi a São Paulo e voltou com autorização para Benedito Damasceno, que manteve sua escola durante décadas. “Deve ter muito diploma por aí assinado por mim”, garante Eduardo, que passou a ser o responsável pelos documentos. “Aliás, o Ditinho era muito trabalhador, mesmo sem andar. Dirigia carros adaptados e tocou muito bem aquela escola”, conta Pimentel. As duas escolas, então, conviveram juntas, sempre com turmas lotadas.

Eduardo Pimentel lembra que, muitos anos depois, o amigo Damasceno o procurou, preocupado. Alguns exames detectaram problemas no coração. Tinha a doença de Chagas, mas ainda viveu muito tempo. O curioso é que certo dia, numa das inúmeras conversas por telefone com o amigo Damasceno, Eduardo percebeu que, do nada, o amigo ficou mudo. “Achei que ele tinha largado o telefone para falar com alguém, mas aquilo me intrigou”, lembra.

 

 

 

 

Benedito Damasceno, antigo instrutor de escola de datilografia, e a filha Wanessa

 


Minutos depois, foi um dos primeiros a receber a notícia. Benedito Damasceno havia falecido, ainda com o telefone na mão. “Eu nunca mais vou me esquecer disso. Mas desta história eu costumo dizer que praticamente crisei as duas escolas de datilografia de Santa Cruz”, afirmou. 

Datilografia já foi matéria

eliminatória em concurso

Durante décadas, grandes escritórios de contabilidade, redações de jornais ou repartições públicas tinham algo em comum: o barulho inconfundível das máquinas de escrever. Elas existiam em todos os locais, de escolas a pontos comerciais. Não foi a toa que na década de 1870 a empresa Remington, fabricante de rifles nos Estados Unidos, abraçou a ideia de fabricar máquinas em massa. Afinal, a Guerra de Secessão havia acabado e a indústria estava em dificuldades. Se tornou uma das gigantes do ramo até o fim das máquinas, quando fez o caminho de volta para fabricar rifles.

O professor Eduardo Pimentel lembra que a datilografia era imprescindível na conquista de um emprego. “Até em concurso público, havia prova prática de datilografia. Em muitos, era eliminatória”, conta.

O melhor datilógrafo era aquele que conseguia escrever sem olhar o teclado. É por isso que, nas escolas, as letras eram apagadas do teclado ou tapadas com um artefato de madeira. “Aquele datilógrafo rápido conseguia emprego fácil. Meu pai conversava olhando para o lado enquanto datilografava”, conta Pimentel.

Com a popularização do computador, as máquinas de escrever se tornaram obsoletas e foram sendo deixadas de lado. Nem todas, pois alguns escritórios e empresas ainda necessitam delas para preencher balanços ou formulários específicos.

As escolas de datilografia, porém, foram fechando as portas. Além das duas mais conhecidas, houve ainda algumas poucas que funcionaram durante breve período em Santa Cruz. A última provavelmente foi a do professor aposentado Celso Fleury Moraes, na rua Rangel Pestana. Hoje, existem cursos de “digitação” online.

 

 

 

 

Página do jornal em que a reportagem foi publicada

 


* Colaborou Toko Degaspari

Publicado na edição impressa de 31 de maio de 2020

 

 

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